CNJ diz que 5 anos no convalidam irregularidade da interinagem em cartrio
CNJ diz que a interinagem em cartório não se convalida com cinco anos
Interinos se apegam às mais variadas teses que podem imaginar para tentar protelar ao máximo suas manutenções irregulares à frente de cartórios, sem as devidas aprovações em concurso público.
Uma dessas teses é a de que o prazo decadencial do art. 54 da Lei n. 9.784/99 (cinco anos) seria aplicável às suas situações irregulares.
Ou seja, como obtiveram a conivência de Tribunais de Justiça durante mais de cinco anos à frente de cartórios sem concurso público, afirmam que o Poder Público nada mais pode fazer a não ser aceitá-los como verdadeiros registradores e/ou notários.
Como se tivesse havido uma usucapião de serviço público, esses interinos querem usurpar para si a delegação de um serviço público.
No âmbito do Processo eletrônico n. 3844120102000000 (em que foi publicada a lista de vacância nacional de cartórios de julho de 2010), a Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, quando analisou milhares de impugnações de interinos, enfrentou a questão e decidiu da forma que segue abaixo.
Processo eletrônico n. 3844120102000000
(...)
Ademais, o poder-dever da Administração de rever seus próprios atos encontra-se expresso no art. 54 da Lei nº 9.784/99, que define o prazo-limite de 5 anos para que a Administração possa anular os atos administrativos.
O prazo estabelecido no referido artigo não se aplica para a declaração de nulidade de ato administrativo ilegal, mas tão somente aos atos anuláveis.
Há reiteradas decisões do C. Supremo Tribunal Federal no sentido de que na atual ordem constitucional a investidura na titularidade de unidade do serviço extrajudicial, cuja vacância tenha ocorrido após a promulgação da Constituição Federal de 1988, depende da realização de concurso público para fins específicos de delegação, inexistindo direito adquirido ao que dispunha o artigo 208 da Constituição Federal de 1967, na redação da EC 22/1982, quando a vaga ocorreu já na vigência da Constituição Federal de 1988 (RE 182641, 378347 e 566314, MS 27118 e 27104, Agravos de Instrumento 516427 e 743906, ADI 417-4, 363-1 e ADI/MC 4140-1, dentre outros).
Portanto, a titularização em um serviço notarial extrajudicial vago após a vigência da Constituição Federal de 1.988, de pessoa que não prestou concurso público regular, é ato que se dá em clara afronta ao princípio republicano da impessoalidade e ao princípio da estrita legalidade administrativa. Pela intensidade do vício, a transformação do interino em titular de um serviço extrajudicial é ato nulo e não simplesmente anulável.
Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, em sua obra "Princípios Gerais de Direito Administrativo", Forense, vol. I, 1ª edição, 1969, p. 576/579, traz a seguinte lição quanto à diferenciação entre atos administrativos nulos e anuláveis:
"A invalidade decorre sempre da violação de uma norma jurídica, que faz acarretar essa conseqüência. Pressupõe a prática de ato administrativo contrário à lei, tendo em vista fatos contemporâneos à sua emanação, e, então, os seus efeitos ficam perturbados, ante essa anormalidade...”
“Será nulo quanto à capacidade da pessoa se praticado o ato por pessoa jurídica sem atribuição, por órgão absolutamente incompetente, ou por agente usurpador da função. Será nulo quanto ao objeto, se ilícito ou impossível por ofensa frontal à lei, ou nele se verifique o exercício de direito de modo abusivo... Ao contrário, será simplesmente anulável, quanto à capacidade da pessoa, se praticado por agente incompetente, dentro do mesmo órgão especializado, uma vez o ato caiba, na hierarquia, ao superior. Outrossim, será tão-somente anulável o que padeça de vício de vontade decorrente de erro, dolo, coação moral ou simulação."
Assim, designação posterior a 05 de outubro de 1988, que não seja decorrente de concurso público regular, só pode ter ocorrido a título precário, pouco importando o nome que lhe foi atribuído. Ainda que se entendesse que o ato irregular aqui analisado é anulável, há que se observar que a parte final do art. 54 da lei 9.784/1999 exclui os atos de má fé da proteção caracterizada pela decadência.
.A alteração do caráter da designação, de precária para definitiva, conforme pretende aquele que só pode ser considerado interino, caracteriza má fé incompatível com o princípio da segurança jurídica, cujo fundamento é proteger a confiança que se deposita no direito e no que é direito.
O prazo decadencial de 05 anos para o desfazimento da irregularidade, portanto, tem por termo inicial o momento em que foi caracterizada a inversão do ânimo da posse por aquele que se julga “dono do cartório”, ou seja, a partir do momento em que o interino revelou, nesta impugnação, verdadeiro animus domini sobre serviço público que após a vigência da CF/1988 somente pode ser delegado por concurso público. O serviço pertence ao Estado e não a um particular nomeado com inobservância ao princípio da impessoalidade.
A Ministra Ellen Gracie no MS28386 MC/DF, publicado em 01.12.2009, ressalva que “situações flagrantemente inconstitucionais como a remoção, por permuta entre notários e/ou registradores, sem a devida submissão a concurso público não podem e não devem ser superadas pela simples incidência do que dispõe o art. 54 da Lei 9.784/99, sob pena de subversão das determinações insertas na Lei Maior do País, a Constituição Federal.”
O Ministro Joaquim Barbosa no MS 28373 MC/DF, em decisão publicada em 27.10.2009, asseverou que “Em relação à alegada decadência do direito de revisão do ato de titularização pelo Conselho Nacional de Justiça, não está completamente afastado o caráter continuado da relação jurídica cujo ato normativo que lhe dava amparo foi tido por inválido. De fato, o exercício da atividade notarial se renova no tempo, de modo a criar constante tensão com normas constitucionais de regência, como a vinculação do acesso ao cargo mediante concurso público”.
Ademais, o novo Regimento Interno do CNJ, que tem por fundamento o § 2º do Art. 5º da EC 45/2004, ressalva expressamente a inaplicabilidade do prazo decadencial de cinco anos quando o ato examinado afrontar diretamente a Constituição Federal (RICNJ, art. 91, parágrafo único).
Desse modo, com base na jurisprudência supramencionada, nego provimento à impugnação.
Intime-se.
Brasília, 9 de julho de 2010.
Ministro Gilson Dipp
Conselho Nacional de Justiça
Fonte: CNJ, Processo eletrônico n. 3844120102000000
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